Do propagandeado Plano Tecnológico, anunciado como a chave para ultrapassar as dificuldades da economia portuguesa, verdadeiramente apenas se destacou o “Magalhães”.
Se do ponto de vista pedagógico, continua discutível a mais valia da sua introdução no sistema de ensino, assim já não acontece quando encarado como um complemento para as aquisições básicas de aprendizagem. Dúvidas também não subsistem quanto ao contributo que pode prestar no aumento do factor motivacional dos alunos e no esbater das diferenças no uso de um bem essencial, ao papel facilitador no acesso às tecnologias de informação e comunicação, à mobilização dos pais para o processo educativo e ao inestimável contributo para a diminuição da info-exclusão junto de muitas famílias portuguesas.
De inegável utilidade real, as infindáveis trapalhadas associadas ao “Magalhães”, transformaram uma boa medida de José Sócrates, no símbolo de uma governação feita de falsidades e enganos, de ausência de ética, de falta de planeamento e de duvidosa legalidade.
Primeiro foi o anúncio da instalação de uma fábrica da Intel em Portugal e correspondente criação de 1000 postos de trabalho qualificados. Pura invenção.
Seguiu-se a apresentação do “Magalhães” como o “primeiro portátil português” e uma “novidade mundial” nos computadores de baixo custo.
Cedo se descobriu que, além do logótipo, nada tinha de português, tão pouco incorporava qualquer inovação tecnológica. O Magalhães não passava da segunda geração do Classmate PC da Intel, há venda desde 2006 em mais de trinta países, que passaria a ser montado em Portugal pela empresa JP Sá Couto, sob a licença da Intel.
Seguiram-se gestos deploráveis nas infindáveis acções propagandísticas. Primeiro com a exploração de trabalho infantil, contratando crianças através de uma agência de marketing, para compor uma das muitas teatrais cerimónias, depois a simulação da entrega de computadores, imediatamente retirados das mãos das inocentes crianças, assim que o primeiro-ministro e a comunicação social viravam costas.
A denúncia dos atrasos na entrega dos computadores não tardou. O que se garantira estar concluído até ao final de 2008, logo foi adiado para a Páscoa de 2009. O ano lectivo haveria de terminar e um novo começar, sem que o Magalhães haja chegado a todas as crianças.
O avultado investimento revelou-se precipitado e atabalhoado. Não faltam exemplos. Milhares de alunos já haviam recebido os computadores, mas aos professores não fora ministrada qualquer formação específica para o uso do Magalhães em sala de aula, nem para ajuda aos pais na sua utilização. Conclusão, a meio do ano lectivo, não estavam ainda reunidas as condições para a aplicação, sustentada e pedagógica, da nova ferramenta.
Os docentes do 1º Ciclo do Ensino Básico foram transformados em agentes comerciais das operadoras de comunicações móveis e, com o escândalo dos muitos erros de ortografia, gramática e sintaxe encontrados no software, quase que obrigados a vestirem a pele de técnicos informáticos, substituindo-se ao Ministério da Educação na tarefa da sua correcção e actualização. Os efeitos desejados não foram alcançados e uma das consequências perversas do projecto ficou patenteado com a venda dos Magalhães "no mercado negro" por parte dos pais de alguns alunos.
Surgem as primeiras noticias que indicam estar a Comissão Europeia a averiguar a possibilidade de Portugal ter infringido as leis comunitárias da concorrência ao adjudicar por ajuste directo, e não por concurso público, todos os programas governamentais ligados ao Plano Tecnológico da Educação, entre os quais a distribuição dos computadores “Magalhães”.
Os portugueses ficam a saber, pela mesma altura, que a empresa JP Sá Couto é acusada da prática dos crimes de associação criminosa e de fraude fiscal e de pertencer a um doloso esquema no ramo da informática, conhecido como “fraude Carrossel”.
O “Magalhães” entra na campanha eleitoral para as legislativas dela saindo no mesmo dia e pela mão do mesmo interessado. Ao anúncio, por uma fonte do Plano Tecnológico da Educação, de que não dispunha de informações sobre o Programa de Distribuição, logo o Governo se apressou a garantir a continuidade do mesmo, naturalmente, se o PS vencesse as eleições.
A recente proposta para a constituição de uma Comissão de Inquérito Parlamentar, a que o PS reagiu desabridamente, visando a análise dos contornos do programa e-escolinhas, que enquadra a distribuição dos computadores Magalhães, bem como as actividades da Fundação para as Comunicações Móveis, é apenas o último capitulo, dos muitos que ainda faltam desta iniciativa governamental que curiosamente, também ela está ainda longe de ter aproveitado todo o seu potencial, como referia ontem a Associação para a Promoção e Desenvolvimento da Sociedade de Informação.
1 comentário:
Artigo muito interessante. Parabéns.
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