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Falar de urgências é falar de emergências, é falar de momentos de aflição, de ansiedade, de angústia e de desassossego. É falar de uma corrida contra o tempo, é falar de salvação ou de morte.
Qualquer reforma governativa nesta área será, assim e sempre, facilmente objecto de contestação social, não chegando, porém e por si só esta circunstância, para explicar as manifestações de descontentamento ao Processo de Requalificação das Urgências. Existem outros factores.
Um discurso governativo excessivamente frio, numérico e economicista, incompatível numa área que requer sensibilidade, aliado a um desconhecimento do custo da reforma da nova rede de urgências e da verificação das condições para o seu avanço, em torno dos imprescindíveis e novos recursos humanos e logísticos.
A impossibilidade de a Comissão Técnica de Apoio elaborar um estudo de forma livre, ferindo à nascença a sua credibilidade, atenta a obrigatoriedade de cumprir escrupulosamente as orientações do despacho ministerial da sua nomeação.
A manifesta contradição entre os compromissos assumidos pelo Ministério da Saúde e a defesa do estudo técnico encomendado, em municípios como por exemplo Santo Tirso, Montijo, Vieira do Minho e Oliveira de Azeméis.
A contradição entre os investimentos recentes em unidades de urgência hospitalar e a determinação, agora, do seu encerramento, como acontece nos Hospitais de Peso da Régua e Ovar.
A tentativa de iludir os portugueses de que o encerramento de 14 urgências hospitalares seria compensada com a criação de 25 novas unidades, quando efectivamente estas não passam de unidades básicas em Centros de Saúde que nunca poderão preencher as funções dos serviços de urgência hospitalar que encerram.
As patentes debilidades e insuficiências do Relatório elaborado por onze peritos, ao deixar um milhão de portugueses a mais de 45 minutos de um serviço de urgência, ao não ponderar da mesma maneira os próprios critérios de avaliação avançados, a inconsideração de factores como a sazonalidade e a mobilidade em alguns concelhos, a ausência de orientações sobre as especialidades dos profissionais de saúde que deverão trabalhar nos serviços de urgência básica, a desconsideração do trabalho de voluntariado no transporte de doentes, a falta de justificação técnica para a existência de três níveis de diferenciação das unidades de urgência, o esquecimento dos hospitais de parceria público-privada e a omissão de importantes ponderáveis como a escassez de médicos especialistas em grandes áreas geográficas, o perfil do utilizador do serviços de urgência, as elevadas taxas de reinternamentos e o facto do recurso não urgente se verificar em mais de 50% dos utentes dos SU.
Artigo publicado no semanário “Opinião Pública”, edição de 20 de Outubro de 2006.
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