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quinta-feira, dezembro 10, 2009

Incontinências Democráticas


A generalidade dos comentadores políticos interpretou a troca de galhardetes entre Maria José Nogueira Pinto (PSD) e Ricardo Gonçalves (PS), ocorridos na Audição da Comissão Parlamentar de Saúde, como um reflexo do clima de crispação entre o Governo e a Oposição, crispação esta justificada pela saída de um executivo minoritário nas eleições legislativas de 27 de Setembro. Não concordo em absoluto.
Os”excessos” não são novidade desta legislatura, nem exclusivo do Parlamento Português. Recuando alguns meses, recordamos o gesto de Manuel Pinho, que conduziriam à sua demissão como Ministro da Economia, o tom e as palavras agrestes trocadas entre Maria de Lurdes Rodrigues e Ana Drago (BE) a propósito da politica de educação, os insultos, encapotados por eufemismos, entre Francisco Louça (BE) e o primeiro-ministro a propósito do Código do Trabalho ou a acesa troca de palavras, sem eufemismos, entre José Eduardo Martins PSD) e Afonso Candal (PS), durante o debate sobre Energias Renováveis.
Estas faltas de bom senso são, aliás, bem mais antigas do que se julga. A este propósito, recomendo a leitura de Eça de Queiroz e alguns dos seus trechos em “Uma Campanha Alegre”. O parlamento actual não é muito diferente do de 1871.
A maneira de fazer política em Portugal sempre foi muito crispada. É certo que não faltam debates marcados pela elevação, educação e cortesia, sem que os argumentos e as convicções deixem ser esgrimidos com e vigor e energia, mas os portugueses estão mais habituados, porque também são sobretudo essas as imagens que passam na comunicação social, a verem o primeiro-ministro e os partidos da oposição, falarem uns com os outros no Parlamento aos gritos, evocando defesas da honra, evocando a mentira, a coragem e a vigarice.
Estes comportamentos, em maior ou menor escala, são naturalmente censuráveis. Não credibilizam a imagem do Parlamento, da classe política em geral e, muito menos dos políticos deles intervenientes.
Os portugueses, que não são entusiastas da democracia de espectáculo, esperam que os políticos ocupem o tempo e as energias a tratar dos problemas colectivos e essenciais do país, não os acessórios ou particulares. Esperam que os políticos sejam notícia pelo que dizem e fazem pensar no progresso de todos e não pelos insultos que dizem uns aos outros.
Os agentes políticos não se podem comportar como os seus piores inimigos. Fazer política à custa de outros políticos é fácil, mas não leva a nada. Difícil é fazer politica dentro da política, procurando sempre e pacientemente melhorá-la.
Os agentes políticos têm de perceber que se não forem os próprios a defenderem a política, ninguém mais o fará. Têm de saber que ser-se combativo não significa ser-se agressivo, significa marcar a agenda, transformar convicções em acções, impor protagonismos de referência.
Os agentes políticos devem interiorizar que a sua credibilidade anda sempre de mãos dadas com a sua serenidade e que o caminho do insulto não é mais que um sintoma da falta de melhores argumentos.

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