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A vontade de criar um sistema de contra-poderes e de auto-limitação do próprio Estado, conduziria, em 1976, à institucionalização do Poder Local Democrático. Depois de quase cinco décadas de absoluto controlo político, administrativo e financeiro do Governo sobre os municípios, seguiram-se trinta anos de indesmentível evolução e desenvolvimento de Portugal e da sociedade portuguesa.
Não obstante as autarquias assumirem um papel ímpar neste desenvolvimento, urge remodelar o seu modelo de gestão, tornando-o mais rigoroso, mais criterioso, mais eficaz, mas simultaneamente mais flexível, mais moderno e mais transparente.
Nada disso é alcançável com a proposta de Lei das Finanças Locais do Governo Socialista. Pior, desrespeita a autonomia e a dignidade dos municípios, valores consagrados na Constituição da República Portuguesa e, castra a capacidade das autarquias responderem cabalmente aos anseios das populações.
Na última sessão da Assembleia Municipal, PSD, CDU e BE, subscreveram autonomamente “Votos de Protesto” à Proposta de Lei do Governo. Os deputados municipais do Partido Socialista limitaram-se a votar contra. Não defenderam a proposta governativa, nem contra atacaram os argumentos das demais bancadas.
Por três grandes ordens de razões, não é de estranhar tamanho silêncio.
Primeiro, para o PS local, os interesses das populações nunca se sobrepuseram aos interesses do partido.
Segundo, a proposta de Lei do Governo é, em muitos dos seus múltiplos aspectos negativos, absolutamente indefensável.
Terceiro, a proposta do Governo, é aquela que melhor serve a estratégia nacional e concelhia de conquista do poder municipal nas próximas eleições autárquicas.
O PSD é maioritário no poder local e detêm as principais cidades do país. Em 2009, as eleições autárquicas e legislativas realizam-se no mesmo dia. Ora, quanto maior for a debilidade dos autarcas social-democratas, fruto do cerco que lhe está a ser montado, maior serão as possibilidades de serem afastados do poder.
Os riscos desta estratégia falhar são pequenos. O país já se habituou às sempre inconsequentes ameaças da Associação Nacional de Municípios Portugueses, a solidariedade entre autarcas não vai, regra geral, além do discurso, a liderança nacional do PSD continua a navegar em águas agitadas, a opinião pública dominante sobre os autarcas é injustamente desfavorável e os eleitos locais do PS, conseguirão passar ao lado desta crise, fruto dos investimentos directos do Governo nos seus municípios e do financiamento discricionário de verbas do Orçamento de Estado como está a ocorrer no presente ano.
O mínimo de clarividência política é suficiente para se chegar a esta conclusão.
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OBS: Artigo publicado no semanário "Opinião Pública", edição de 6 de Outubro de 2006.
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